Por que o Brasil precisa celebrar Portugal

Por José Manuel Diogo

200. Cravados. No próximo 7 de setembro. Grito no Ipiranga! Independência ou morte. Não encham mais o saco. Tchau queridos!

Foi brigando feio que o Brasil conseguiu tornar-se independente de Portugal, mas hoje, dois séculos depois, a briga virou romance e os países irmãos estão mais próximos que nunca. E com vontade de celebrar.

1822. D. Pedro, ainda príncipe de Portugal desobedece a uma ordem do rei europeu (seu pai João VI) e declara o Brasil independente. Ele vira Imperador e o Brasil uma nação. Pode não ter sido bem assim, com grito e tudo, mas como todos sabem, a história, quem a conta, são os vencedores, e esta é a narrativa que vingou.

Apesar de muitos pensarmos que a transição foi pacífica, até mesmo um negócio de família, a verdade que é o processo de independência foi pleno de episódios brutais que causaram graves ressentimentos (e mesmo ódios) entre aqueles que ficaram ambas as margem do oceano. Poucos historiadores subiram este pleito à categoria de guerra, mas o certo é que ela existiu e não foi pera doce.

No final da disputa os novos brasileiros tiveram de pagar muito caro pelo seu país, em vidas e em dinheiro, Adicionando a história dessa fatura tudo o que já havia sido escavado e explorado, em ouro, borracha diamantes e esmeraldas, a narrativa do. “vilão português” ganhou asas e prosperou.

1900 - 1960. Durante muitas décadas a imagem dos portugueses no Brasil foi sendo construída com tijolos de pecado e telhados de malandragem e o “pai portuga” foi piada fácil permanente até que, muito recentemente, e pela lei do tempo, se foi dessa sorte libertando.

Mas nos últimos 30 anos, por muitos motivos diferentes — e quase de repente — tudo mudou. Talvez duzentos anos seja mesmo a idade que um país precisa ter para poder olhar a sua história com olhos de futuro.

1986. A mudança que atingiu Portugal for radical. Em pouco mais de três décadas ele vem se transformando de forma estrutural, atingindo um significativo desenvolvimento econômico e social alinhado a uma participação ativa na gestão da União Europeia, que o torna, em muitos aspetos um dos mais desenvolvidos e modernos países do mundo.

2004. A qualificação de sua infraestrutura econômica e sociocultural chama a atenção de investimentos globais, mas olhando a sua modernidade, localização, segurança e bom clima, o coloca no centro da mais importante plataforma ocidental da mobilidade humana, atraindo um número cada vez maior de migrantes de alto padrão entre os quais, especialmente, muitos brasileiros.

É por isto que, na data em que Portugal e os portugueses celebram o seu dia nacional, 10 de junho, simultaneamente dia do poeta Luiz Camões, o Brasil e um numero cada vez mais importante de brasileiros, celebra junto uma descoberta recente: Que há um “Brasil” na Europa que se chama Portugal.

2022. No dia em que milhões de portugueses espalhados pelo mundo celebram a sua pátria, em Portugal, os 550 mil brasileiros que lá moram celebram também. Porque o futuro dos dois países, em um mundo com barreiras à comunicação e à mobilidade cada vez menores, será cada vez mais partilhado.

Publicado originalmente na Folha de.Paulo

Anterior
Anterior

APBRA na conferência Gulbenkian

Próximo
Próximo

ABPRA lança Selo de Referência da lista dos "200 Anos 200 Livros"